26.9.21

NIMBY vs YIMBY: porque nunca perguntam o que o dono do quintal acha disso?

"Not in my backyard". 

Não no meu quintal, que vá misturar pessoas de todo tipo na quadra - ou no bairro - do outro, lá no Centro, ou bem longe, lá na periferia distante, onde não há transporte, segurança, educação, cultura e outros artefatos públicos que estão bem perto, no meu quintal (embora eu não os use).

"Yes, in my backyard".

Sim, com certeza, aqui pode misturar todo tipo de gente - e com ele os perigos, virtuais e reais, e os choques de realidade que fazem com que certas pessoas cultivem uma nostalgia de tempos passados, tão ruins quanto hoje, e outros tantos fujam para as montanhas (ou os condomínios fechados, quintais próprios, nos quais manda quem é dono do pedaço).

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"Nimbistas" e "yimbistas" travam há anos batalhas pelo controle das cidades, os primeiros com seus advogados e os segundos com o poder de convencimento junto aos grandes "think tanks" governamentais - aqueles que, de tempos em tempos, se encantam com a ideia de cidades para pessoas e tentam vendê-los a um público pouco interessado nesse tipo de utopia possível.

E aí entramos no grande problema, principalmente para os defensores da cidade inclusiva: o dono do quintal, que nunca é consultado a respeito do que fazem com a sua casa.

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Há uma desvantagem significativa para os defensores de teses como ciclovias a granel, "parklets" e outras medidas que convidem as pessoas a participar da cidade: os vizinhos da cidade inclusiva se incomodam demais com os efeitos indesejáveis dessa política, sem visualizar vantagens nas mudanças que burocratas (e especialistas) querem impor para eles. 

Os "yimbistas", por sua vez, mais atrapalham do que ajudam, ao adotar contra os "nimbistas" comportamento típico de quem se acha acima de qualquer discussão, por estar a favor de uma "tese melhor" para a sociedade. 

Não importa que negócios tenham mudado de lugar pela falta de estacionamento, coisa que qualquer drogaria franqueada se esmera em oferecer, ou que arquiteturas hostis sejam instaladas em todo canto para evitar mendigos na porta da sua loja - para os defensores da cidade para todos quem não pensa como eu é preconceituoso, fascista, machista... e ponto.

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O "nimbista" é mais inteligente para colocar seu raciocínio em prática: ele aciona advogados para defender o interesse público - e garantir o seu interesse preservado, por tabela. Associações de moradores que entram para defender patrimônio histórico "intocável", características originais de terrenos que tornam certos bairros em condomínio fechado, mudanças de estações do metrô para defender interesses ecológicos recentíssimos...

... está cheio de exemplos da hipocrisia de quem não quer indesejáveis por perto, mantendo o valor de bairros intocáveis no meio da miséria humana. Dá até para sentir certo júbilo quando ocorre uma pichação nestes bairros dos que não querem nada no seu quintal.

Até porque, nesse caso, também não consultaram os donos do quintal se eles queriam reservar áreas valiosas da cidade para o bel prazer de uma meia dúzia de bem-aventurados com um bom jurídico - que consegue tornar o que deveria ser público em privado, na prática.

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Lembra o que falamos sobre o que o dono do quintal acha disso? 

Pois é, talvez esse seja o maior dos problemas nas discussões urbanísticas: saber o que os moradores, e as pessoas que vivem numa cidade de espaço constantemente "privatizado", e segmentado, acham de tais medidas.

"Ah, mas tem audiência pública..." - na qual o "afegão médio" dificilmente vai. 

"Ah, mas a população aprova..." - então porque o uso de recursos supostamente populares, como ciclovias, é bem menor do que as reclamações a respeito delas?

O fato é que não ouvimos muito além de nossas bolhas: para quem está no Baixo Augusta ciclovia é maravilhoso, mas quando implementadas numa rua estritamente comercial, de passagem, elas se tornam um empecilho para quem precisa parar com seu carro, fazer compras e seguir viagem. Não há o hábito de preferir ir a pé aos estabelecimentos, e por motivos que vão além da "carrocracia" - assim como não há vontade de encarar o desconhecido por parte de segmentos como o da classe média, motivo pelo qual o "nimbismo" prospera.

Uma política que permita uma cidade inclusiva tem que combater o medo do cidadão de perder algo com a "inclusão urbana". Sem isso, não tem como propor "no meu quintal sim" - até porque os vizinhos que vão aparecer não são os Backyardigans.

Que vivem todos num condomínio - e compartilham o mesmo quintal.