10.10.23

A retórica da guerra: como Israel está ganhando (no marketing) o direito de arrasar com a Faixa de Gaza

O bom senso deveria mandar que as pessoas fossem cautelosas ao tratar de certos assuntos, seja na internet ou na vida fora da telinha. A vida, por sinal, ensina que deve-se tomar bastante cuidado com gente que pode pagar boas assessorias de imprensa para divulgar apenas coisas boas a seu respeito.

Poderia estar falando da filha de um cantor sertanejo, a cara da bailarina da música - mas isso também se aplica a lugares, e governos, como é o caso do novo queridinho dos progressistas, o Estado de Israel.
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A melhor Parada Gay do Oriente Médio está em Israel - na verdade, a única. 

Telaviv é uma cidade altamente cosmopolita, o país é cheio de gente jovem e arrojada, a economia do século XXI casa bem com Israel - e Jerusalém, convenhamos, é um espetáculo para os cristãos. Ninguém nota os judeus ortodoxos e seu monte de filhos, ou a corrupção do primeiro-ministro que consegue superar Bolsonaro na estupidez; o Estado judeu é arrojado, e gosta dessa imagem.

Não espanta, portanto, que a esquerda ao redor do mundo esteja apoiando a possibilidade de uma carnificina na Faixa de Gaza, ainda mais considerando-se que o Hamas não tem uma assessoria de marketing que seja capaz de fazer o que Israel conseguiu: deixar os colonos bem escondidos enquanto exibe uma imagem progressista (e hipócrita) de si mesmo, escondendo o que fez no passado.

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A esquisita aliança entre a direita ultraconservadora, que baba ovo na única democracia do Oriente Médio, com a esquerda progressista, encantada com a liberdade que só existe no Estado de Israel, faz todo o sentido, como fruto de uma bem sucedida estratégia de marketing e de virtudes que, no frigir dos ovos, só uma democracia bem financiada poderia ter. 

O buraco, porém, é mais profundo do que parece: a paz não virá por carnificinas, e os líderes do Hamas não estão em Gaza. O misto de partido político, entidade assistencial e grupo terrorista pode estar acuado, mas feriu o titã israelense no que mais dói - o orgulho.

Eles não tem mais segurança, e estão procurando culpados. Daí para uma carnificina, é um pulo.


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Faz bem o governo brasileiro em não tratar o Hamas como grupo terrorista. A ONU não faz isso, e o atual ocupante da Presidência do Conselho de Segurança tem que ter tato, e estômago, nessas horas em que há muita informação desencontrada, e bastante gente trabalhando para criar uma imagem de "bonzinho" para si - e de "malvado" para o outro.

Israel está numa cilada: querem invadir e procurar os líderes e guerrilheiros do Hamas casa por casa, numa Faixa de Gaza sitiada há anos, com gente (os palestinos que lá vivem) que nunca teve cidadania respeitada nem direitos estabelecidos de verdade. Talvez nem sejam considerados gente pelo governo.

Israel, o Estado, fará a guerra que sempre soube fazer. Mas saberá fazer a paz, depois disso?

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