12.7.09

Prosa

 Carla

 

            Carla era pudica. Tímida, a princípio, me entreolhava com aqueles olhos cor de caju de um brilho tão estranho que não podia imaginar. Depois, mais solta, falava-me da vida, dos amores, daqueles que deixara escapar por entre seus dedos, tão doces como os de uma menina, e tão fortes como só uma mulher daquelas poderia ter.

 

            Ah, Carla, como me lembro dos dias, das horas queridas, dos tempos tranquilos em que tua doce voz me tornava mais calmo, tranquilo e sereno, ajudando meu corpo a desejar-te mais, me dando um motivo para então querer-te, sonhar-te, sofrer-te, amar-te, sorrir-te, sentir-te, bem junto, juntinho de mim.

 

            Oh, Carla, quão doces eram os instantes de amor, em que teu jeito simples, de moça pudica, se revestia em tudo - a forma menina de despir-se ao vento, o jeito acanhado de encarar o que fazia, a tal timidez de uma moça que sonha, a grande vontade de amar-se e querer-se, querendo um homem bem junto de si, mas abominando aquilo que via, e o que sentia, e o que fazia, e o que amava, e o que sonhava, já que ela queria - e, realmente, queria, apesar de ser pura demais para ver isso.

 

            Ah, Carla, minha doce Carla ...

 

            Faz algum tempo a revi. E ela parecia distante. Tinha casado, a garota, fazia dois anos. Tornara-se, mais do que nunca, mulher. Amadurecera, aprendendo com seus erros, e perdera o olhar ingênuo que conheci, substituido então por um olhar bem mais forte, mais bravo, sereno - mas com o mesmo brilho de antes, singelo e autêntico, como se o efeito do sofrimento humano tivesse tornado aquele olhar mais forte, sublime ... e capaz.

 

            Aquela não era a mesma Carla que tinha na memória. Mas, ainda assim, não a esqueci, pois, apesar de tudo aquilo que eu via, e sentia daquela menina que os anos e as dores transformaram em mulher feita, e dura consigo, a emoção de encontrá-la ainda era a mesma, e no fundo, no fundo eu sabia que, mesmo com tudo o que lhe acontecera, ela ainda era a doce garota que um dia eu vi, e quis como amiga, e como mulher, para sempre e sempre, até o fim dos meus dias - e esses sentimentos, eu também sabia, nem mesmo a dureza da vida que eu já vivi tiraria de mim.

 

 

fps, 24/06/1996, 14:45

2 comentários:

Aliz de Castro Lambiazzi **jornALIZta** disse...

Fábio, isso não é verdade, vocês são apaixonantes quando querem... hihihihi.
É sério, nós mulheres temos manias de apontar, por segundo, cada defeito de vocês, mas temos que reconhecer que são apaixonantes em seu estado mais simples (tô falando de homem mesmo, homem que gosta de mulher porque gosta de ser homem, só isso, sem invencionices). Acho que nós estamos colocando vocês muito pra baixo viu.
É a modernidade que confunde todo mundo. Comemore, todos os dias são de vocês, e como fazem falta quando resolvem sumir de nossas vidas viu!
Beijos

everaldo disse...

AAAlizzz !!!

Pois é Aliz, ainda bem que existem mulheres como voce.

...mas... mudando de assunto: este cantinho do Fábio é bem legal. Ele escreve muito bem