6.5.10

Demolir o Minhocão: eu pago pra ver!!!

Nada como um dia após o outro, ou como uma bobagem após a outra: se Kassab realmente estiver levando a sério a demolição do Minhocão um altar deveria ser erguido em sua honra em cada entidade com "Vivo" no nome na cidade de São Paulo, já que efetuar uma plástica dessas no Centro Velho é uma coisa que ninguém teria coragem (ou mesmo loucura) de fazer por aqui.

Infelizmente é melhor esperar sentado e pagar para ver esse milagre das Operações Urbanas se realizar, considerando-se alguns pequenos detalhes que não são levados em conta quando se pensa nos “sonhos” e aspirações do povo de São Paulo, de sua conhecida classe média e da elite pensante paulistana, que parece viver sempre num mundo muito distante, e que não percebe o quanto essa aspiração é sem sentido.

Motivos? Temos muitos – mas, para começar, citemos três.

O primeiro, evidentemente, é a própria utilidade do Elevado Costa e Silva: substituir a principal via de ligação entre o Leste e o Oeste da capital, é tarefa das mais complicadas numa cidade em que se depende de carro para quase tudo – e tem que se dar razão a Paulo Maluf quando este dizia que "todo mundo critica o Minhocão mas todo mundo anda nele" …

… e, antes que eu me esqueça, NÃO, não dá para esquecer do carro em SP nem deixar de viver sem ele numa cidade como a nossa, porque ônibus e metrô são quase sempre uma porcaria e muitos não iriam deixar o carro em casa se não for por alternativas melhores do que elas tem hoje, ao contrário das pessoas que trabalham em entidades com “Defenda” ou “Vivo” no nome (e que estão sempre atrás de idéias maravilhosas para “melhorar a cidade” e “trazer o glamour de volta”, etc. e tal).

E já que falamos nas entidades, chegamos ao motivo número 2 para que essa “operação” dê errado: dificilmente o futuro daquela área deixará de ser vinculado às entidades de defesa dos bairros tradicionais, as que tem “Vivo” ou “Defenda” no nome e que mantém a visão utópica de retornar aos tempos áureos em que suas regiões eram “chiques no úrtimo” - mas que se esquecem de entender porque as pessoas deixaram esses lugares por cantos melhores da cidade.

Ou, para ser mais exato, porque a fila dos grandes empreendimentos, e do dinheiro e poder em São Paulo, andou, dos Campos Elíseos para a Paulista, e depois para a Berrini – e aí vale repetir o que dissemos em outros posts: repito, nesse contexto, o que disse em posts abaixo: centro cultural e sala de concertos não são, nem nunca foram, motivos para fomentar a presença em uma área da cidade.

E isso porque quem quer ir a um museu ou um centro cultural apenas vai até lá (quando vai), faz o que precisa fazer e sai correndo, porque ali “é muito perigoso” e porque “no meu bairro é que eu vivo a minha vida, de verdade”.

E aí chegamos ao maior motivo pelo qual não dá para acreditar na demolição do Minhocão: a São Paulo do Centro Velho não é, nem nunca foi, a São Paulo

A verdadeira São Paulo, quer as pessoas aceitem ou não, não está exatamente em seus bairros chiques, tampouco nas favelas que se desenvolvem ao seu redor, muito menos no Centro que experimentou crescimento com os alternativos mas que estancou pela falta de sensibilidade estatal em querer que a cidade seja o que não é.

A verdadeira São Paulo, a que as pessoas aprendem a amar, está em seus bairros, que foram se desenvolvendo quando as pessoas foram saindo dos cortiços e pensões e arranjando um terreninho aqui ou ali para desenvolver sua família; essa São Paulo, que não é retratada facilmente porque não é vista de fora, é extremamente provinciana e aprecia o que os corretores de imóveis chamam de “ar do interior” e que o cidadão comum paulistano chama, simplesmente, de “cara de casa”.

O paulistano típico jamais – repito: JAMAIS – sairia de muito longe do bairro onde nasceu e cresceu; essa, aliás, é uma relação parecida com a dos migrantes que vem para cá mas que ainda estão presos à sua terra natal.

Ele se acostuma a viver em deslocamentos de carro porque não se vê morando mais perto do trabalho e porque sua vida, no final, está muito mais perto de suas origens, no bairro, que nos grandes pólos de serviços – e que ficam muito mais cheios de gente que não é daqui do que filhos legítimos dessa cidade (veja ao seu redor e comprove se não é isso mesmo).

Esse cidadão tem um poder descomunal: foi por ele que se fez a Nova Marginal e o Rodoanel; ele é quem paga pedágio para ir à Alphaville, Osasco e a “praia”, e em geral adora seu carro mais até do que a casa em que vive; mas, mais do que isso, ele esteve por trás de todas as mudanças políticas dessa cidade no pós-democracia.

Foi ele quem elegeu Maluf com gosto, vencendo a “nordestina sapata”, botou o Pitta no governo sabendo o que ele era, votou em Serra para tirar a “loira vagaba” do comando da cidade e endossou Kassab e sua política de limpar a cidade, tornando-a “bonitinha” - porém extremamente ordinária.

E é esse cidadão, a classe média que tem carro ou que aspira a ter um, quem manda de fato e de direito nessa cidade.

Para eles, o Minhocão é extremamente útil; e é assim que ele vai continuar.

Para o bem.

Ou para o mal.

(revisto em 14/05, às 20:00)

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