Aquela noite
Aquela noite, escura e fria, mantinha o passo das emoções dos seres humanos em constante alerta.
Não se podia brincar com ela, tão grande era a rigidez com que a escuridão tomara as ruas da grande cidade, transformando a alegria em tristeza, a satisfação em dor, o riso em pranto, a verdade em mentira.
A vida em morte.
Naquele passo, um homem andava pela imensidão.
No que pensava?
O que fazia?
O que sentia?
Por onde andara?
Ou, mais ainda, o que estava fazendo ali, já que apenas andava, não se sabe por onde, não se sabe por quê, indo de um lugar para outro, sem caminho, sem direção - apenas indo, e vindo, procurando um lugar em sua solidão.
Era até engraçado ver aquela pessoa andando, subindo a ladeira, se não fosse trágico ver o que acontecera depois.
Pois, enquanto isso, vemos outro cidadão que desce, acelerando o passo.
Parece cansado de um dia de trabalho, e fatigado pelos seus problemas, mas não a ponto de deixar que ele parasse, para pensar, como se estivesse querendo ir p´ra casa, e chuveiro, e comida, e cama quentinha, e então o sono, que revigora as almas para o grande dia que viria depois, e sua rotina diária em busca do pão, e dos sonhos, e da vida, e de si mesmo.
Um homem descendo a estrada de pé, o outro subindo.
Fatalmente, se encontram, e então ...
Param, para um pequeno papo.
Conversa ríspida, insossa, cheia de interjeições, onomatopéias, palavrões.
Não dá p´ra se ouvir nada, nem mesmo ver - mas percebe-se: pode acabar mal.
Súbito, percebe-se um certo prateado nos bolsos de um - justamente o que subia, aquele mal-falado, o que não se confiava, o que não se percebia …
… socorro, meu Deus, o que ele vai fazer ?
Com medo, um recua, e então o outro saca ...
… um isqueiro, desses tipo Zippo que se encontra por aí, prateado e bonito, com gravuras em ouro, lindo de se ver.
O outro tira um maço do bolso, e ambos fumam, calmamente, em pé na ladeira.
Dois Hollywood no chão, ambos se cumprimentam, e seguem seu rumo, tranquilos, em paz.
Viro as costas, e, logo depois ouço um ruído estranho como som de ...
… TIRO ?
Nada não, só um escapamento solto, no chão da ladeira, marcando o final de um dia de cão.
fps, 05/11/2010, 21:05
Nenhum comentário:
Postar um comentário