26.8.05

Tesão comum


Tesão comum
(por Fábio Peres da Silva)

 
Imagine a situação - você, homem sério, respeitador, casado (mas sem filhos), vivendo na rotina diária que se faz cada vez mais necessária num casamento, seja ele moderno ou não (porque rotina é necessária, e quase toda rotina, que se saiba, é diária com pausa no fim de semana para o diferente que não é tanto assim ...).
 
Aí, você chega em casa, doido de vontade de simplesmente se largar no sofá ao lado da mulher amada depois para sua sessão de descarrego diária (nada a ver com a Universal, mas entenda como "o difícil trabalho de descompressão de um dia de trabalho que pode variar do tédio até a violência contínua, dependendo do dia e do trabalho") e vê a mulher toda preparada, vestido preto colante, meia-que-você-sabe-que-é-de-sete-oitavos-porque-mulher-se-acha-sexy-quando-a-meia-é-7/8-presa-por-uma-cinta-liga, e já pensa ... "é hoje" ... "é hoje que me dou mal" ...
 
- Mas querida, logo hoje?
 
Homem é um bicho estranho por natureza: grosso modo, antes do casamento é capaz das maiores loucuras, transa no parque à vista de estranhos, dentro do carro em uma rua movimentada, estoura o cartão de crédito em motéis caríssimos se preciso for para conquistar a sua amada (se é que ela é amada e não uma proto-conquista); entretanto depois de casado o maior prazer dele é pegar o pijama e descansar, que o bicho (e os bichos) não são de ferro, e o dia de branco ainda não passou ...
 
- Você não me entende, não é mesmo?
 
Mulher também é assim mesmo: antes de casada vive a vida pudica, não se revela a não ser em poucos momentos especiais (e que quase nunca são a contento); mas depois vive querendo mais, desejos, affairs, segredos de alcova que só são contados no banheiro feminino, e por aí vai; se bem que a coisa mudou muito nos últimos tempos e as mulheres atiradas estão cada vez mais atiradas, mas não é sempre bem assim que as coisas acontecem, os homens adoram a conquista e vão à toda se o desejo é mais difícil, e séculos de genética e educação não mudaram tanto o mundo como se imaginava que fosse ...
 
O resto é conhecido: depois de finalmente cederem, eles vão a um bom restaurante para jantar um prato caríssimo que nem ela gosta, mas que "é chique"; um bom vinho rega o prato (pelo menos algo tem que ser bom); depois, de volta pra casa, as carícias e insinuações, respondidas com um certo trato - e como ela rebola, meu Deus, antes era toda pudica, agora que casou deu pra isso ...
 
E aí é que o bicho pega: na hora H, na cama, a sua ansiedade constrangida e a tentativa dela ser o que não é dá num tremendo fracasso; ou você age como um robô consternado, sem jeito nem mesmo para as carícias de praxe, e ela reclama, ou você está ansioso demais, ou você simplesmente desaba na cama - fracasso total, choradeira e no fim aquele "deixa disso, descansa"; e ela dorme em seus braços, afinal de contas ambos tem que trabalhar no dia seguinte, não é mesmo?
 
No dia seguinte, você chega em casa, dá um beijo na mulher (que está com aquela camisola de sempre, calcinha branca - e sem maquiagem !!!), tira as tranqueiras dos bolsos e vai para o banho; e já no banheiro percebe que o mastro está começando a querer ficar rijo ... sai do banho, se veste com aquele pijama ou moletom surrado de sempre e vai jantar o arroz-com-feijão-maravilhoso-que-só-ela-sabe-fazer ... assiste à novela das 8 (em parte, porque vc sempre dá uma passada nos outros canais) sempre de olho na cena mais picante, e roçando nela ... vai para a cama, beija e roça na sua amada um pouquinho aqui, um pouquinho ali ...
 
... e aí ela sobe em cima de você, e você em cima dela; vocês fazem amor como loucos, beijos, abraços, sussurros, frases, "eu te amo", "eu te adoro"; você a penetra como um vulcão, movimentos fortes de um lado e circulares do outro, até que a fúria se torne em êxito, o simples no extremo, e ambos caiam felizes, exaustos pelo gozo final.
 
Com tempo para uma última pergunta, sua, não dita mas pensada:
 
- Porque as coisas não são sempre simples assim, querida? Eu só queria saber ...

30/11/03, 11:45

24.8.05

De olho na religião:

UMA "FATWA EVANGÉLICA"

Assisti, estarrecido, ontem, vários telejornais brasileiros noticiarem que o evangelista americano, Pat Robertson, sugeriu que o governo americano assassine o presidente venezuelano, Hugo Chaves.

Minha primeira lembrança de Pat Robertson foi a de ter ligado a TV nos EUA e vê-lo entrevistando a cristã holandesa, Corrie ten Boom - que perdeu o pai e a irmã nos Campos de Concentração Nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

A família ten Boom, ficou famosa no mundo inteiro através do livro e filme, O Refúgio Secreto (The Hiding Place). O "Refúgio" era um cômodo, na casa deles, preparado para esconder Judeus durante a perseguição Nazista. Após terem sido descobertos, a família Boom teve o mesmo destino dos Judeus. Apenas Corrie escapou com vida.

Poucas pessoas carregaram na vida o testemunho do Evangelho de Jesus Cristo tão claramente quanto Corrie ten Boom. Dar a vida, preservar a vida, sacrificar a vida para que outros vivam, esse foi o exemplo máximo de Jesus Cristo. No entanto, ontem, na sugestão do Pat Robertson, eu vi o que o Fanatismo Religioso pode fazer aos homens.

Pat Robertson sugere o assassinato de Hugo Chaves baseado no fato de que "seria mais barato fazer isso do que entrar numa guerra que custe US$ 200 bilhões".

Minhas perguntas, ao confirmar a veracidade da sugestão de Robertson, são as seguintes:

  1. Como alguém pode sugerir um negócio desses num programa de tv sustentado com ofertas feitas "em nome de Deus" e para "“propagação do evangelho"?
  2. Qual a diferença entre essa sugestão de Pat Robertson e a fatwa Islâmica proferida contra o escritor indiano, Salmon Rushdie? (A fatwa é uma declaração de que qualquer um que mate Rushdie estará prestando um serviço ao Islã)

Ou seja, ao sugerir o assassinato de Hugo Chaves, Pat Robertson está agindo da mesma forma do Islã - que ele tanto diz ser maligno em sua homepage (http://www.patrobertson.com).

Ao ver atitudes como essa do Pat Robertson é que eu confirmo quanta coisa diabólica já foi feita em nome de Jesus. Sim, foram cristãos como Pat Robertson que assassinaram e saquearam, em vários lugares do mundo, "em nome de Jesus" e para "propagação do Evangelho"; e, infelizmente, com "dinheiro ofertado para a obra de Deus".

Vejo também que Pat Robertson e Bin Laden são irmãos gêmeos. Ambos defendem que aqueles que se oponham às idéias deles devem ser mortos. Portanto, com essa visão esposada por eles, podemos dizer, sem medo de errar, que Cristianismo e Islamismo servem ao mesmo deus - o da intolerância.

Não fosse o registro dos evangelhos de que os próprios discípulos de Jesus se enganaram quanto ao propósito de Cristo, seria uma grande surpresa ver essa sugestão de Pat Robertson.

"E [Jesus] mandou mensageiros adiante de si; e, indo eles, entraram numa aldeia de samaritanos, para lhe prepararem pousada, mas não o receberam, porque o seu aspecto era como de quem ia a Jerusalém. E os seus discípulos, Tiago e João, vendo isto, disseram: Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma, como Elias também fez? Voltando-se, porém, repreendeu-os, e disse: Vós não sabeis de que espírito sois. Porque o Filho do homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las. (Lucas 9:52-56)"

Posições como essa do Pat Robertson me fazem ver duas coisas.

A primeira é que ainda há muitos cristãos que não sabem a que espírito pertencem; e nem para que Jesus veio a esse mundo e habitou entre nós.

A segunda é que com certos cristãos a única unidade possível é em torno da Bíblia - "e se ela estiver fechada", como bem disse Denton Lotz, secretário executivo da Aliança Batista Mundial, ano passado, durante as comemorações do Dia da Bíblia, no Vaticano.

Deus tenha misericórdia e nos livre de "evangelistas" como Pat Robertson!

Que Ele possa continuar nos dando cristãos como Corrie ten Boom!

Bento Souto

P. S. (FPS3000): Causa nojo que eu diga isso, mas a verdade é que há muitos cristãos perdidos no legalismo sem sentido e sem razão - infelizmente o que a gente sente vendo atitudes como as de Pat Robertson é resumível em uma palavra: VERGONHA.


19.8.05

Final de "O Aprendiz" - comentários

Assim como as trocentas pessoas que deram 21 pontos para a Record e fizeram a emissora ficar na frente no IBOPE por 45 minutos em relação à Globo, e posso dizer o seguinte: a edição brasileira dos últimos episódios foi fiel às edições americanas, que mostram uma coisa no "gancho" do penúltimo episódio para desmenti-la no posteriori.
 
Quem viu o fim dos dois episódios, penúltimo e último, deve ter pensado que Justus cometeu uma injustiça tamanha ao colocar o inexperiente Porcel como o vitorioso, mesmo com derrotas nas estatísticas e na prova final; a colunista do Zapeatrix (http://zapeatrix.blig.ig.com.br) fez duras críticas baseadas no desempenho da Tatiana em comparação com o meu xará vitorioso no programa - detalhe esse que eu só soube da boca do Justus no penúltimo episódio, e que praticamente traiu sua preferência.
 
Entretanto, vale lembrar que a última prova de "O Aprendiz" é também um exercício onde se mede a capacidade gerencial de um indivíduo, e, nesse caso ele deu de dez: o contraste entre as cenas finais editadas, com Tati indo para o carro sozinha e desfilando suas qualidades após um agradecimento mais formal que frio, e Porcel indo abraçado aos outros com seus colegas de grupo - e ex-adversários - defendendo suas qualidades mais do que o próprio, foi o que resumiu toda a final.
 
Destaques, ainda, para o desfile de todo o curriculum da Tatiana antes da vitória, para a defesa incontida da Bel, e para o corte do link da pizzaria onde alguém deveria falar em nome dos familiares de Porcel - e que só conseguiu dizer, num tom de quem estava nitidamente em outro universo, "ELE VAI GANHAR ... PORQUE ELE MERESCHE !!!" ... rs ...
 

9.8.05

Sinal da cruz


"Em nome do Pai ..." quantos não deturparam sua mensagem, dizendo que ELE queria quando na verdade eram ELES que queriam, matar, fuzilar, roubar, esquartejar para seu próprio prazer e para satisfazer sua sede de ganância.
"Em nome do Filho ..." quantos não falam besteiras, bobagens, insanidades, declarando-se poderosos quando na verdade são somente massa em estado agudo de decomposição.
E, ainda assim, há aqueles que procuram, e zombam "... do Espírito Santo ...", ao recusarem seu consolo e sua proteção procurando alívio na Lei, ou na permissividade, ou na relatividade da vida, ou na frouxidão de seus próprios atos, ou, pior ainda, em fardos maiores que suas costas mas que ELE nunca pediu para ninguém carregar, em vida.
E, diante de todos esses fatos, quem poderá realmente selar-se com este sinal dizendo: "amém"?

FPS, 09/08/2005, 13:07

8.8.05

Duas idéias

Era bonita e donzela - mas toda mulher assim tem algum defeito.
 
O pai, uma fera; a mãe, uma megera; e o genro, um pé no saco; sem falar no cunhado fanfarrão.
 
No dia seguinte, depois do sono bendito, a consciência - nada daquilo era verdade; eram todos honrados, até segunda ordem.
 
Ou não?

FPS, 08/07, 16:00
 
 

2.8.05

Na torre

Era um rapaz meio assim, meio assado, tímido, quieto, recatado - talvez até demais para o gosto dos outros. Não tinha um grande físico, não era muito bonito, usava óculos e estava acima do peso - enfim, não era lá grande coisa. Mas naquele dia, não se sabe porque, estava inquieto. Não parava no lugar, não queria conversa com ninguém, não falava e, quando perguntavam o que acontecia, apenas respondia um singelo: "não sei". Foi assim até o fim do dia de serviço.

Saiu, lá pelas sete da noite, foi até o estacionamento, pegou o carro ... e sumiu no mundo.

Não estava a fim de voltar para casa - fazer o quê por lá?; não queria enrolar mais no serviço, embora tivesse coisas a fazer; tinha problemas para resolver, mas ah!, isso, deixa p´ra mais tarde.

Não queria saber de nada - queria mesmo era espairecer a cabeça, dirigir um pouco, relaxar - apesar de que relaxar, às sete horas, no trânsito louco de São Paulo, era realmente coisa difícil de se pensar. Mas, assim mesmo, foi.

Brigadeiro, Paulista, Ibirapuera, volta no parque, Paulista, Consolação, Praça da República, São João, Augusta, Paulista, Alameda sei lá o quê, Paulista, Paulista, Paulista ... retorna perto do Paraíso, e torna a Paulista.

Nessa brincadeira já são onze horas, os casados estão em casa, os solteiros bagunçando (ou seria o contrário? Não sei, nesse "admirável mundo novo onde circulam criaturas tais" ...), e então alguma coisa acontece.

Pára em frente à um dos prédios. Paulista, 900, imagem viva de uma avenida que representa dinheiro, fama e poder nos tempos do Brasil Real.

Sobe as escadas. Não sabe porque, mas alguma coisa o leva mais alto, procurando o topo do local, o topo do mundo, sempre em frente, sempre acima.

Escada daqui, corredor dali, elevador acolá, chega ao seu objetivo.

A torre. Enorme torre de onde saem imagens e sons que chegarão em casas onde pessoas distraídas estarão, naquele momento, assistindo um bom filme, depois da sagrada novela das oito de todas as noites.

Uma escada. O caminho para onde ele quer chegar.

Sobe, sobe, mais e mais alto, até que, chegando ao topo, ele tem a visão mais magnífica que um ser humano poderia ver.

Uma mulher. Sim, uma mulher. Do jeito que ele queria, do jeito que sempre sonhou. Linda, bela, magnífica escultura de um gênio da arte ... a acenar para ele, pedindo que faça com ela o que ele sempre quis.

Aproxima-se, e nesse momento tem inicio um ato que sobressai as forças da natureza. Beija-a, abraça-a, acaricia seus maravilhosos cabelos soltos ao vento. Arranca de si tudo o que pode impedí-lo nessa prodigiosa hora, e inicia-se o ato em si.

Nesse momento, o que sente é tão maravilhoso que nada poderia ser descrito à um estranho depois - pois nada que se sente de uma forma é passível de ser entendido por outros. E tudo isso em um ritmo crescente, que o faz esquecer as noites mal dormidas, o trabalho enfadonho, as atividades sem sentido que tinha feito ao longo de sua vida, e tudo o mais.

Morrer? Não se importava. Morreria feliz, sabendo que se sentia bem.

Chega o ápice. Geme, grita, sua, sofre, delira!

Tinha concluido o que viera fazer ali.

É então que ouve um ruído, como de asas batendo, várias asas em sincronia. Olha para a direção de onde surgiu o ruído, e vê ... um helicóptero, e um homem de dentro falando, por um megafone:

" Atenção, vocês que estão em cima da torre. Os senhores serão levados à delegacia por crime de atentado ao pudor e perturbação da ordem pública. Queiram descer para serem acompanhados pelos policiais que estão à porta do mesmo elevador por onde entraram ..."

(Observação: a frase original não seria liberada nem para maiores de 21 anos.)

Ao ter consciência da realidade, ele olha para a mulher que foi sua parceira naquela noite. Vê em seus olhos o mesmo ideal, o mesmo propósito, enfim - o mesmo sentimento de nulidade emocional e de dever cumprido que os levaram ali, levados sabe-se lá por que mão, para fazer ... sabe-se lá o que.

Ele a beija e lhe dá sua mão, no que é correspondido.

E os dois pulam - para o infinito.

...

Manchete da Folha de São Paulo do dia seguinte: "Loucos amantes pulam para a morte, nos céus de São Paulo."


(escrito sob o pseudônimo de Omar O. Sirep. em 27/10/1995)

Porque nem tudo é poesia ou prosa ...

Dos melhores "arquivos mortos" do sistema eleitoral, em tempos de CPI e que tais (e a reforma política, a maldita mãe das reformas que nunca chega), uma boa crítica de O Globo, escrita por um de seus editores:

Manter as regras
ALI KAMEL

Alguns leitores se espantaram quando disse aqui que em todos os países há inconformidade com o sistema eleitoral. E, no entanto, isso é verdade. Mesmo nas democracias mais consolidadas, há movimentos buscando reformas. A sorte deles é que esses movimentos não vão adiante. Porque qualquer novo sistema produzirá novas críticas. Mais importante do que reformar é garantir que os eleitores conheçam bem o sistema e, assim, saibam como fazer para levar ao poder os seus preferidos. Manutenção das regras, eis a chave de um bom sistema.

O que aqui chamamos de sistema distrital, adotado nos EUA e no Reino Unido, por exemplo, tem sofrido toda sorte de críticas. Nesse sistema, o país, o estado ou a cidade são divididos em distritos. Para facilitar, imagine um distrito que eleja apenas um deputado. E que cinco candidatos, de partidos diferentes, concorram ao posto. O mais votado será o único eleito. No meu exemplo, suponha que, dos cinco candidatos, três consigam 20% dos votos, um, 17% e o terceiro, o vencedor, 23%. Com apenas 23% dos votos, ele representará todo o distrito. Na prática, os que não votaram nele ficarão sem representante. Imagine agora que todos os distritos do país tenham tido comportamento igual. Isso significará que, com apenas 23% dos votos, um partido terá 100% das cadeiras do Parlamento.

Evidentemente, isso é um exemplo que dificilmente acontecerá na realidade. Mas, freqüentemente, o partido vencedor tem proporcionalmente menos votos populares do que lugares no parlamento. A vantagem desse sistema é que ele é mais propício a dar origem a maiorias sólidas. Os trabalhistas ingleses tiveram 37% dos votos populares, mas ficaram com 55,2% dos assentos no Parlamento. Os conservadores tiveram 33% dos votos populares, apenas quatro pontos a menos do que os trabalhistas, mas ficaram com 157 cadeiras a menos. É democrático? É, porque os trabalhistas venceram nos distritos. Mas parte da sociedade ficou sem representação.

Há países que adotam o sistema de dois turnos: os dois mais votados no distrito voltam a disputar. Na França, o segundo turno é disputado por todos os candidatos que obtiverem pelo menos 12,5% dos votos, ganhando quem obtiver a maioria simples. Esse modelo, porém, agrava a sub-representação: um partido minoritário que tenha conseguido a maioria simples em um único distrito pode ficar sem essa vaga no segundo turno se seus adversários se unirem contra ele.

Isso é parcialmente resolvido nos sistemas proporcionais. No exemplo que dei antes, os cinco partidos elegeriam parlamentares: três partidos teriam 20% do Congresso, um teria 17% e o terceiro, 23%. Nos sistemas de listas fechadas, o eleitor vota no partido e nem toma conhecimento de quem são os candidatos. Quem dirá sempre quem são aqueles que serão os representantes do povo serão as burocracias partidárias. Se um partido tiver conquistado o direito de eleger 12 deputados, os eleitos serão os 12 primeiros de uma lista definida, antes, pelo próprio partido. É democrático? É, porque os eleitores delegaram isso aos partidos.

Mas eu não me sentiria confortável sabendo que meia dúzia de pessoas escolheu meus representantes. Isso não acontece no sistema de listas abertas, em que o eleitor escolhe a ordem dos eleitos. Os mais votados do partido são aqueles que serão os escolhidos. Se o partido tiver conquistado o direito de eleger 12 deputados, os 12 mais votados serão os eleitos. Dizem que só no Brasil e na Finlândia há sistema proporcional com listas abertas. É falso. Vários países da Europa, como Holanda e Suécia, têm listas abertas. São mais restritivas, porém. Na Suécia, o eleitor vota no partido, indicando o candidato de sua preferência. Se o partido conquistar o direito de eleger quatro deputados, os eleitos serão os mais votados desde que tenham obtido, no mínimo, 8% dos votos do partido. Se o quarto mais votado tiver obtido 6%, ele deixará de ser eleito e em seu lugar entrará aquele que o partido tiver posto na frente na lista feita antes da eleição. Mesmo que esse candidato tenha obtido menos que 6% dos votos. Neste sistema, o partido guarda boa influência.

Aqui no Brasil, não é assim. O eleitor tanto pode votar na legenda como no candidato. Os votos no partido ajudarão a dizer quantos deputados o partido elegerá, mas os eleitos serão sempre os mais votados. Vejamos o caso do Enéas. Ele teve um milhão e oitocentos mil votos e, com isso, o Prona ganhou o direito de eleger Enéas e mais cinco deputados. Quatro deles, no entanto, tiveram, cada um, menos do que mil votos. Isso é um problema? Não sei. Porque pelo sistema de lista fechada os parlamentares não têm voto algum. Portanto, nisso, o nosso sistema é parecido com o de listas fechadas, que querem adotar. Quem fica insatisfeito com essa peculiaridade ficará ainda mais com o sistema que estão propondo.

A grande desvantagem de sistemas proporcionais, de lista aberta ou fechada, é que eles respeitam as diversas correntes de opinião mas, por isso mesmo, fragmentam muito o espectro político, tornando difícil o advento de maiorias de um partido só. Como tive oportunidade de dizer, vejo isso como vantagem: é o antídoto para salvadores da pátria, o governo terá de refletir sempre um arco de pensamento necessariamente mais amplo.

Para contornar esses problemas, algumas nações adotaram o chamado voto misto: parte dos deputados é eleita pelo voto distrital e parte pelo voto proporcional. Esse sistema, porém, guarda os defeitos dos dois outros e nenhuma das suas virtudes: as maiorias são mais difíceis de serem alcançadas do que no distrital puro e as correntes de opinião continuam sub-representadas. Eu poderia relacionar aqui outros sistemas eleitorais para mostrar que todos têm defeito, mas creio que estes já são suficientes.

Nosso sistema precisa criar cláusulas de barreira e fidelidade partidária. Com isso, temos grandes chances de resolver o problema de maiorias estáveis. Acordos feitos entre os partidos terão de ser respeitados pelos deputados. Mas mais importante do que mudar as regras é fortalecê-las. Se nós tivermos instituições fortes, moral elevada, ética, uma polícia vigilante, um Judiciário zeloso, roubar, aceitar mensalão ou usar cargo público para roubar serão exceções. Não adianta mudar as regras. É preciso que elas sejam cumpridas.

Agora, duas perguntas, a título de pesquisa de opinião:
1. Você acha que vale a pena discutir política ou prefere apenas fazer o jogo das "CPI caras" da vida? Vale a pena discutir política, ou é melhor falar só de literatura e dos "que tais" da vida?
2. Aliás, o que você sabe sobre os termos que estão descritos nesse texto?